Wednesday 22 July 2015

A QUINTA DA MOITA LONGA E A ORIGEM DO TOPÓNIMO LOURINHÃ

Muito se tem dito e escrito acerca da origem do topónimo Lourinhã.

Entre as teses que alguns investigadores avançaram, duas houve que reuniram maior consenso. 

Uma, onde se diz que Lourinhã vem de Lourien, terra natal do cruzado francês  D. Jourdain, que recebeu de D. Afonso Henriques esta vila como recompensa pelos serviços prestados na conquista de Lisboa (1147). 

E outra, onde se diz que teria sido o Casal Lourim, porventura baptizado pelos Romanos como o nome de Laurus ou Laurinum, que teria dado origem à Lourinhã.

Em minha opinião, nem uma tese nem outra, são verosímeis. 

Relativamente à primeira, Lourien, leia-se um documento escrito em latim medievo para se verificar que este argumento não tem fundamento:[1]  

 "...Hec est carta de foro quem Jurdanus concedente jilustri Rege dono allfonso dedit populatoribus de lauriana tam presentibus quam fruturis..."

Nesta carta, verifica-se que quando D. Afonso Henriques ofereceu a Lourinhã a D. Jourdain, esta já existia, com o nome de Lauriana.

Rege dono allfonso dedit populatoribus de lauriana.

Lauriana é a junção do substantivo lauro ao sufixo ana, que indicia procedência. 

Assim sendo, Lauriana  traduz-se em  "terra de Lauro", tal como  Cíceroiana se traduz em “terra de Cícero”.

Relativamente à segunda hipótese, "Casal de Lourim", a verdade é que neste local nunca foram encontrados quaisquer vestígios da presença romana.

Como terá então nascido Lauriana?

No tempo de Marco Aurélio, imperador de Roma que viveu entre 121 -180 d.C., existiam na Lusitânia duas localidades, que pela sua situação geo-estratégica, assumiam lugar de relevo: o porto de mar da Atouguia, que mais tarde, no inicio da Nacionalidade, viria a ser oferecido por D. Afonso Henriques à Ordem dos Templários – onde a partir daqui faziam a ligação marítima entre a Europa e a Terra Santa (Anais do Convento de Cristo, Tomar) –, e, a civita (cidade) de Eburobrittium, recentemente descoberta junto a Óbidos.

Segundo o Prof. Jorge de Alarcão[2] , Eburobrittium era governada por catorze senadores, entre os quais Caio Julio Lauro, que teria a sua villa  em local perto de Miragaia (Lourinhã), que tudo indica ser a Quinta da Moita Longa. 


Quinta da Moita Longa

É aqui que vamos encontrar os tão almejados vestígios de uma villa romana:  a muralha com 120 metros de comprimento que cerca um dos lados dos jardins; os dois tanques situados em dois planos diferentes – um com o dobro das dimensões do outro –, característica tão peculiar da arquitectura romana; as lajes à volta dos tanques, feitas à base de óxidos de ferro e recobertas de engobe vermelho não vitrificado; um marco feito com os mesmos materiais cuja marca do oleiro é a letra "v", que toponómicamente significa villa; as pedras calcinadas das antigas termas (a água em contacto com as pedras calcinadas, lança vapor); e os arcos de pedra de volta perfeita descobertos na mata de loureiros que cerca o outro lado dos jardins (o loureiro era a árvore que os Romanos consagravam a Apolo, deus do Sol).


Quinta da Moita Longa – Marco de delimitação de villa romana

No entanto, há também quem considere que a origem do topónimo Lourinhã deriva dos loureiros que antigamente abundavam na região. 

Do latim, lauro, traduz-se em loureiro.

Acontece que os loureiros só se dão nas margens dos rios ou em zonas de muita humidade. E os rios que atravessam o concelho da Lourinhã – o Rio Grande e o Rio do Toxofal –, até ao séc. XVII, eram dois braços de mar que se estendiam respectivamente até à actual Igreja de Santa Maria do Castelo e ao Toxofal de Baixo, num local que ainda hoje toma o nome de “Braço de Mar”.

Uma vez que as águas dos braços de mar são salobras, logo, a tese de que a Lourinhã era rica em loureiros, parece não fazer sentido.

Há efectivamente uma mata de loureiros na Moita Longa e outros que se encontram dispersos pelo concelho. Mas não mais do que isso.

Já a tese de que o topónimo Lourinhã vem do senador romano Caio Julio Lauro, parece fazer todo o sentido. 

A sua pedra tumular foi reutilizada e colocada numa das esquinas exteriores do altar da igreja de São Lourenço dos Francos, em Miragaia, uma povoação que fica próxima da Moita Longa (3 km).

Lauriana, a terra de Lauro, o fundador da Lourinhã.


[1] IAN/TT, Leitura Nova, Estremadura, Livro II, fls. 234 v - 235 v
[2] Jorge de Alarcão, Portugal – Das Origens à Romanização

No comments:

Post a Comment